segunda-feira, 21 de março de 2011

O Despertar dos Mágicos (32). Simon Newcomb provara que os aviões não poderiam voar


Nenhuma imagem será louca demais, nenhuma hipótese será excessiva: aríetes para arrombar a fortaleza. Há engenhos voadores, há exploradores no espaço. E se eles apanhassem, à passagem, para os examinar, alguns organismos vivos deste mundo? Creio que nos pescam. Será que somos muito apreciados pelos feitores das esferas superiores? Sinto-me encantado por supor que, afinal de contas, posso ser útil a qualquer coisa. Estou certo de que flutuaram diversas redes na nossa atmosfera, e que foram identificadas a trombas ou a furacões. Creio que nos pescam, mas apenas o menciono de passagem.. .

Louis Pauwels e Jacques Bergier. DIFEL

Eis atingidas as profundezas do inadmissível, murmura com tranqüila satisfação o nosso amável precursor Charles Hoy Fort. Retira a sua viseira verde, esfrega os olhos cansados, alisa o bigode de foca, e vai à cozinha ver se a sua boa esposa, Ana, ao cozer os feijões do jantar, não corre o risco de lançar fogo à barraca, aos cartões, às fichas, ao museu da coincidência, ao conservatório do improvável, ao salão dos artistas celestes, ao gabinete dos objetos caídos, a essa biblioteca dos outros mundos, a essa catedral de Santo-Algures (Universo pressentido, onde o fantástico se torna provável), ao cintilante, fabuloso trajo de Loucura que usa a Sabedoria.
Ana, minha boa amiga, é melhor que apague o seu fogão. Bom apetite, Senhor Fort!
Uma hipótese para a fogueira. - Onde o eclesiástico e o biologista fazem o papel de cômicos. - Pede-se um Copérnico da antropologia. - Muitos espaços brancos sobre todos os mapas. - O doutor Fortune não é curioso. - O mistério da platina derretida. - Barbantes que são livros. - A árvore e o telefone. -Um relativismo cultural. - E agora, uma boa historieta!
Ação militante para a maior amplidão de espírito possível, iniciação à consciência cósmica, a obra de Charles Fort vai inspirar diretamente o maior poeta dos universos paralelos, H. P. Lovecraft, pai daquilo a que se chama geralmente ficção científica e que nos parece, na realidade, ao nível das dez ou quinze obras-primas do gênero, como a Ilíada e a Odisséia da civilização em marcha. Em certa medida, o espírito de Charles Fort inspira igualmente o nosso trabalho. Nós não acreditamos em tudo. Mas acreditamos que tudo deve ser examinado. Por vezes é a observação dos fatos duvidosos que dá aos fatos verdadeiros a sua mais ampla expressão. Não é pela prática da omissão que se atinge o todo. Como Fort, esforçamo-nos por rever um certo número de omissões, e aceitamos o risco de passar por anormais. Ficará para outros o cuidado de descobrir boas pistas na nossa floresta virgem.
Fort estudava tudo o que, aparentemente, caíra do céu.
Nós estudamos todos os vestígios, prováveis ou menos prováveis, que algumas civilizações desaparecidas possam ter deixado sobre a Terra. Sem excluir a menor hipótese: civilização atômica bem anterior ao que chamamos a pré-história, ensinamento vindo dos habitantes de Algures, etc. Dado que o estudo científico do passado longínquo da humanidade foi iniciado há pouco e nele reina a maior confusão, estas hipóteses não são mais loucas nem têm menos fundamento do que as hipóteses vulgarmente aceites. O importante, para nós, é dar ao assunto o máximo de amplidão.
Não vamos apresentar ao leitor uma tese sobre as civilizações desaparecidas. Vamos simplesmente propor-lhe que encare o problema segundo um novo método: não inquisitorial. Segundo o método clássico, há duas espécies de fatos: os escandalosos e os outros. Por exemplo, as descrições de engenhos voadores em textos sagrados muito antigos, a prática de poderes parapsicológicos entre os primitivos, ou a presença de níquel em moedas datando de 235 antes de Jesus Cristo' são fatos escandalosos. Excluídos. Proibição de os examinar. E há duas espécies de hipóteses: as incômodas e as outras. Os frescos descobertos na gruta de Tassili, no Saara, representam, entre outras personagens de capacetes com longos cornos, dos quais saem fusos desenhados por meio de milhares de pontos minúsculos.
Dizem que se trata, possivelmente, de grãos de trigo, testemunhos de uma civilização pastoral. De acordo, mas não há disso prova alguma. E se se tratasse da representação de campos magnéticos? Horror! Pavorosa hipótese! Bruxaria! Loucura! Para a fogueira! Afinal, o método clássico, a que chamamos inquisitorial, dá resultados como este:
Um eclesiástico indiano, o reverendo Pravanananvanda, e um biologista americano, o doutor Strauss, da John Hopkins University, acabam de identificar o abominável homem das neves. Seria pura e simplesmente o urso pardo do Himalaia. Nenhum dos dois estimáveis sábios viu o animal. Mas, declaram eles, a nossa hipótese, visto ser a única que não é fantástica, deve ser a autêntica. Portanto, ir-se-ia contra o espírito científico prosseguindo pesquisas supérfluas. Glória ao reverendo e ao doutor! Resta apenas comunicar ao Yéti que ele é o urso pardo do Himalaia.
O nosso método, de acordo com a nossa época (comparável, em vários pontos, com o Renascimento), apóia-se sobre o princípio da tolerância. Fora a inquisição. Recusamo¬nos a excluir fatos e a desprezar hipóteses. Escolher lentilhas é uma ação útil: as pedras são impróprias para consumo. Mas nada prova que certas hipóteses excluídas e certos fatos escandalosos não sejam nutritivos. Nós não trabalhamos para os débeis, os alérgicos, mas para todos aqueles que têm, como se costuma dizer, bom estômago.
Estamos persuadidos de que existem no estudo das antigas civilizações inúmeras negações da evidência, exclusões a priori, execuções inquisitoriais. As ciências humanas progrediram menos do que as ciências físicas e químicas, e o espírito positivista do século XIX ainda reina ali, como senhor tanto mais exigente quanto pressente que a morte se aproxima.
A antropologia está à espera do seu Copérnico: Antes de Copérnico, a Terra era o centro do Universo. Para o antropologista clássico, a nossa civilização é o centro de todo o pensamento humano, no espaço e no tempo. Lamentemos o pobre primitivo, encerrado nas trevas da mentalidade pré-lógica. Quinhentos anos nos separam da Idade Média e mal principiamos a libertar essa época da acusação de obscurantismo. O século de Luís XV prepara a Europa moderna, e foram necessários os recentes trabalhos de Pierre Gaxotte para que esse século deixasse de ser considerado como uma barreira de egoísmo erguida contra o movimento da história. A nossa civilização como qualquer outra, é uma conspiração.
O Ramo de Ouro, de sir James Frazer, é uma volumosa, obra revestida de autoridade. Ali se encontram reunidos os folclores de todos os países. Nem por instantes passa pela cabeça de sir Frazer que se poderia tratar de qualquer outra coisa além de comoventes superstições ou costumes pitorescos. Os selvagens atingidos por doenças contagiosas comem o cogumelo penicillum notatun: servindo-se da magia imitativa, eles procuram aumentar as suas forças ingerindo esse símbolo fálico. Continua a ser uma superstição o emprego da digitalina. A ciência dos antibióticos, as operações sob o efeito do hipnotismo, a obtenção da chuva artificial por meio da dispersão de sais de prata, por exemplo, deveriam ser suficientes para que certas práticas primitivas fossem retiradas da rubrica ingenuidades.
Sir Frazer, profundamente convencido de fazer parte da única civilização digna desse nome, recusa-se a admitir que possam existir, entre os inferiores, técnicas autênticas, mas de uma espécie diferente das nossas, e o seu Ramo de Ouro assemelha-se a esses mapas elaborados por iluminadores que apenas conheciam o Mediterrâneo: cobriam os espaços brancos com desenhos e inscrições, aqui o País dos Dragões, aqui a Ilha dos Centauros... Aliás, não é verdade que o século XIX se apressa, em todos os domínios, a camuflar todos os espaços em branco de todos os mapas? E mesmo nos mapas geográficos? Existe no Brasil, entre o rio Tapajós e o rio Xingu, uma terra desconhecida, vasta como a Bélgica. Também nenhum explorador se aproximou jamais de El Yafri, a cidade interdita da Arábia. Um dia, em 1943, na Nova Guiné, desapareceu sem deixar rasto uma divisão japonesa armada. E se as duas potências que entre si dividem o mundo chegarem a um acordo, o verdadeiro mapa do planeta reservar-nos-á algumas surpresas. Depois da bomba H, os militares procedem em segredo ao recenseamento das cavernas: extraordinário labirinto subterrâneo na Suécia, subsolo da Virgínia e da Checoslováquia, lago oculto sob as Baleares... Espaços em branco sobre o mundo dos homens. Nós não sabemos tudo a respeito dos poderes do homem, dos recursos da sua inteligência e do seu psiquismo, e inventamos ilhas de Centauros e países de Dragões: mentalidade pré-lógica, superstição, folclore, magia imitativa.
Hipótese: existiram civilizações que podem ter ido muitíssimo mais longe do que nós na exploração dos poderes parapsicológicos.
Resposta: não existem poderes parapsicológicos.
Lavoisier provara que não havia meteoritos declarando: Não podem cair pedras do céu, visto que não há pedras no céu. Simon Newcomb provara que os aviões não poderiam voar, visto que é impossível uma aeronave mais pesada do que o ar. O doutor Fortune vai para a Nova Guiné para estudar os Dobus. É um povo de mágicos, mas têm a particularidade de acreditar que as suas técnicas mágicas são válidas em toda a parte e para todos. Quando o doutor Fortune parte, um indígena oferece-lhe um feitiço que permite tornar-se invisível aos olhos dos outros. Servi-me dele para roubar carne de porco em pleno dia. Siga à risca as minhas recomendações, e poderá fanar tudo o que quiser nas lojas de Sidney. -Evidentemente, diz o doutor Fortune, nunca tentei. Lembrai-vos do nosso amigo Charles Fort: Na topografia da inteligência poder-se-ia definir o conhecimento como a ignorância rodeada de risos.

Imagem: catalog.chaosium.com

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