quarta-feira, 9 de setembro de 2009

Índia antiga. Química e Física


O conhecimento de química na Índia surgiu em primeiro lugar com referência a assuntos puramente práticos. A cerâmica era produzida e aquecida e os pigmentos, preparados, mas o mais significativo desses usos primitivos da química foi na fusão do ferro, que provavelmente começou na Índia entre 1050 e 950 a.C. Um milênio e meio depois, os fundidores hindus eram capazes de fundir alguns pilares de ferro que se tomaram famosos. Um deles, ainda em Deli, tem uma altura de mais de 7 metros, com outro meio metro abaixo do solo e um diâmetro que varia de 40 centímetros a mais de 30; pesa mais de 6 toneladas, é feito de ferro forjado e sua fundição teria sido considerada impossível, naquele tamanho, na Europa, até época relativamente recente. Mas a coisa mais notável, talvez, nesse e em outros pilares de sua espécie, é a ausência de deterioração ou de qualquer sinal de ferrugem. O motivo, não se sabe ao certo até hoje, embora pareça que isso se deva à formação de uma camada de óxido magnético de ferro na superfície, resultante do tratamento original da superfície.

Nada, até agora, indica que houve qualquer tentativa de pesquisa química; para a fusão do ferro, a cerâmica, a tinturaria, a fabricação de vidro, a manufatura de pigmentos e todos os outros usos práticos do conhecimento químico, não havia qualquer teoria subjacente, qualquer tentativa de pesquisar a natureza do processo. O interesse centralizava-se no produto e apenas no produto. As coisas pareceram mudar, contudo, no século VII d.C., quando os budistas tântricos estavam encontrando apoio em todos os níveis da sociedade, pois foi nessa época que a alquimia entrou em cena; isso ocorreu muito tarde, em comparação com outras civilizações, e foi claramente uma importação de outra civilização. Entretanto, as mentes hindus e budistas deram sua própria contribuição à alquimia, e o assunto teve rápido crescimento, concentrando-se, por um lado, no simbolismo macho-fêmea e, por outro, na importância do mercúrio. A busca de um elixir da imortalidade não parece ter atraído os alquimistas indianos, como ocorreu com os taoístas chineses, embora essas idéias tenham surgido realmente na medicina indiana; mas um esforço considerável foi realizado na preparação de substâncias que aliviassem as moléstias que afligiam a humanidade.

É interessante notar que, embora os minerais fossem amplamente usados na alquimia, seu em- prego nas preparações medicinais tinha sempre - assim pensavam os hindus - que ser temperado com ingredientes herbáceos, que "digeririam" o mineral. O progresso da alquimia foi acompanhado pela criação de laboratórios com suas fornalhas, retortas e, acima de tudo, seus alambiques para a extração de essências, e talvez seja significativo o fato de que os alquimistas indianos pareçam ter adotado o alambique da Ásia Oriental em vez do tipo alexandrino. Isso talvez seja uma evidência das origens da alquimia indiana - houve contato entre a Índia e a China, por meio das instituições do budismo, desde o século I d.C.

Do século IV d.C. até cerca do século XI, a ciência indiana fez seu maior progresso, e foi na última parte desse período que idéias jainistas e budistas estimularam o que era um novo conceito na ciência indiana - uma teoria atômica. Uma teoria de quatro elementos, associada a uma quinta essência celeste, foi adotada por longo tempo - era uma importação da Grécia -, mas agora a formação dos corpos a serem encontrados no mundo natural era descrita em um contexto atômico. A teoria atômica indiana postulava que cada um dos quatro elementos tinha sua própria classe de átomos, sendo todos indivisíveis e indestrutíveis.

Átomos diferentes não podiam entrar na combinação, mas átomos semelhantes, sim, contanto que estivessem na presença de um terceiro. Dois átomos podiam causar um "efeito" (um dyad), enquanto três desses efeitos podiam produzir um efeito de outra natureza (um triad). Assim, a causa produzia um efeito, mas era imediatamente absorvida pelo efeito que fizera surgir, o qual, por sua vez, assumia a função de causa, e assim a seqüência continuava. O modo pelo qual os primeiros efeitos (dyads) eram arrumados em um triad dava origem, como se pensava, às diferentes qualidades de uma substância.

No Ocidente, ao que sabemos, uma teoria atômica foi proposta por Demócrito e Leucipo, e apresentada, com grande discernimento, por Lucrécio, mas a teoria indiana, com seus dyads e triads, era não só mais complexa, mas também mais sutil. Com sua descrição de efeitos e causas, era ímpar entre as idéias atômicas primitivas, e atraiu pensadores e homens de ciência indianos até o século XVIII.

Outro aspecto da física indiana que deve ser mencionado é a teoria do ímpeto, proposta para justificar o movimento contínuo de um corpo. Esse foi um dos problemas que os gregos não conseguiram resolver com o habitual sucesso. Devido ao seu conceito de movimento natural e violento, Aristóteles foi forçado a considerar a pressão do ar como o meio pelo qual o movimento de um corpo continuava, uma vez que tivesse recebido um impulso inicial. O que o ponto de vista indiano sugeria era que, quando um corpo experimenta pela primeira vez a força que o põe em movimento, a própria aplicação dessa força comunica uma qualidade, vega ou ímpeto, que faz com que o corpo continue a se mover da mesma maneira. Quando o corpo encontra um obstáculo, pára ou continua a se mover, embora mais devagar; a redução da velocidade depende da neutralização do ímpeto pelo obstáculo: a completa neutralização resulta, naturalmente, numa parada.

Essa doutrina do ímpeto foi uma notável contribuição aos pensamentos e explicações a respeito do movimento dos corpos. No Ocidente, a doutrina aristotélica, apesar de todas as suas falhas, foi mantida até o século XIV d.C., embora, é verdade, tenham surgido uns poucos espíritos pioneiros que ousaram questioná-la. No século XIV, desenvolveu-se uma teoria do ímpeto, mas sua dívida para com a teoria indiana não está bem esclarecida. O que está claro, porém, é que aquilo que os indianos propuseram foi um antecessor do que mais tarde foi desenvolvido matematicamente no Ocidente durante, a Revolução Científica.

in Ronan, C. História Ilustrada da Ciência de Cambridge. Rio de janeiro: Zahar, 1986.
http://indologia.blogspot.com/2008/04/qumica-e-fsica.html

Imagem: http://www.ceticismoaberto.com/referencias/pilarferro.htm

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