Não foram
poucas vezes em que fui interrompido durante uma de minhas palestras sobre IA
(Inteligência Artificial) com esta pergunta polêmica:
– Será que
um dia os seres humanos serão dominados pelas máquinas?
É evidente
que este questionamento apresenta vários desdobramentos, incluindo o aspecto
social do desaparecimento do emprego, como consequência da paulatina
substituição do homem pela máquina, seja na lavoura na qual tratores e
colheitadeiras competem com o trabalho manual ou na indústria onde a automação
vem substituir as atividades pesadas e repetitivas.
No entanto,
vamos começar nossa abordagem com algo bem mais sensacionalista e polêmico:
– O antigo e
famigerado complexo de Frankenstein.
Todo mundo
conhece esse clássico do terror fundamentado no argumento de que um dia a
criatura há de se voltar contra o seu criador e então destruí-lo.
Numa versão
mais atual, as máquinas – ou de mais específico valor – os robôs, poderiam
repentinamente assumir o controle, decidindo sobre o futuro de uma humanidade
completamente subjugada.
Aliás, é
esse o argumento básico de muitos sucessos de público no cinema e na TV, tais
como Matrix, Galactica, Exterminador do Futuro, etc.
Esse tema
tão recorrente nas histórias de ficção científica geralmente apresenta o
“robô-como-ameaça”, que segundo o criador do termo “robótica” o grande
ficcionista Isaac Asimov, a coisa toda poderia ser resumida por algo do tipo “
clangue clangue” e “Ah!”.
Porém, mesmo
sendo repetitivas e pouco imaginativas estas histórias que povoaram os
primórdios da FC alimentam o imaginário de muitos defensores das teorias da
conspiração e é um assunto também em pauta nas conversas de corredor dos
seminários científicos ou encontros de tecnólogos. Geralmente sou abordado na
hora do cafezinho e a conversa se desenrola de um jeito bem natural. Eu
geralmente contraponho as teorias da dominação com o argumento de que a
automação exerce um papel crucial na redução dos custos da produção e no
aumento da segurança do trabalho e presta um auxílio inestimável na melhoria da
qualidade de vida.
No entanto o
teórico da conspiração insiste em sua visão. Vou apresentar aqui uma dessas
conversas apenas para ilustrar:
Do radar ao
matar
Quando um
sistema automático de controle de velocidade tira fotos de um automóvel que
ultrapassa a velocidade limite da pista, ele se pergunta se aquele “robô”, que
não fez academia de polícia ou tampouco passou nos testes para ser agente de
trânsito, tem a devida autoridade para multá-lo.
Tecnicamente
o tal “radar” é um robô “primário”, ou seja, um simples sistema perceptivo
dotado de servomecanismo.
Traduzindo:
– apresenta sensores de velocidade acoplados a um dispositivo que aciona uma
câmera fotográfica.
– Quem passa
do limite é simplesmente fotografado.
Deixando de
lado as questões legais que dariam um bom caso para advogados antenados
(desculpem o trocadilho), o teórico da conspiração aborda pelo lado do puro
terror. E assim me propõe esta reflexão:
– Imagine
professor, se ao invés de acionar uma câmera fotográfica o tal servomecanismo
acionasse uma metralhadora ou um lança chamas ou um lançador de mísseis?
– Sem
dúvida, um bom argumento para um filme de FC (ou de terror) recheado de efeitos
especiais – foi minha resposta.
Porém, de
onde o sujeito tirou essa ideia?
Não é
segredo que, mesmo em plena crise, o governo norte-americano (só pra citar um
exemplo) tem investido milhões de dólares em sistemas automáticos para
aplicação bélica. Sistemas de IA foram e estão sendo desenvolvidos para pilotar
tanques, aviões e – sinta o arrepio na espinha – mísseis nucleares.
Evidentemente
isso não se restringe apenas à política bélica norte-americana. Esse tipo de
pesquisa tem avançado de forma acelerada no mundo inteiro.
Daí a
paranoia!
Tenho um
colega que ao discorrer sobre a aplicação bélica dos agentes inteligentes da IA
preconiza:
“Cada vez
que se produz uma máquina inteligente com a intenção de matar se pressupõe a
hegemonia da estultice humana.”
Sintetizando
– é a conjugação pós-moderna entre a inteligência artificial e a estupidez
natural.
Mesmo neste
cenário distópico é possível contrapor:
– As
máquinas respondem aos programas. Se ela for programada para matar, quem de
fato é o assassino é o seu programador. Ficamos bem longe do questionamento
inicial. Não são as máquinas que dominam o homem. É ele que as utiliza como
instrumento de eliminação, mesmo que isso não faça a menor diferença para a
vítima sob a alça de mira de um robô bélico.
No entanto é
só para isso que servem as máquinas inteligentes? Matar e dominar? Não somos
servidos todos os dias de forma construtiva por recursos da IA? Desde os
programas de busca na Internet, caixas eletrônicos e até robôs cirurgiões?
O que nos
leva ao segundo e terceiro desdobramentos da nossa questão. Desdobramentos
esses também criados por Asimov:
- O robô-como-pathos: a máquina é apenas uma ferramenta que pode ser usada tanto para o bem quanto para o mal.
- O robô como produto industrial regulamentado: uma ferramenta que responde não apenas à sua programação, mas que também cumpre rigorosas normas de segurança (aquelas que, por exemplo, o impeçam de ferir ou destruir sistematicamente seu criador).
Porém, isso
é assunto para o nosso próximo encontro. Não percam!
[Foto por Bistrosvage]
Sem comentários:
Enviar um comentário