Um dos mais polêmicos achados arqueológicos do
mundo – o mecanismo de Anticítera ou máquina de Antikythera – tem mais uma de
suas funções reveladas: a previsão dos ciclos de quatro anos dos jogos
olímpicos e outros jogos pan-helênicos correntemente usados no helenismo
clássico como base para a sua cronologia.
Tendo sido descoberto no início do século XX
juntamente com várias outros objetos nos restos de um naufrágio de um antigo
navio romano à profundidade de aproximadamente 43 metros na costa da ilha grega
de Anticítera (entre a ilha de Citera e a de Creta), sua importância e
complexidade não foram compreendidos até recentemente.
A construção foi datada do século 1 a.C, sendo que
artefatos desse nível de tecnologia e de complexidade só foram registrados a
partir do século XVI, quando relógios e mecanismos astronômicos começaram a ser
construídos na Europa Ocidental.
O professor Michael Edmunds da Universidade de
Cardiff, que liderou seu estudo mais recente afirmou: “Este dispositivo é
simplesmente extraordinário, é o único de seu tipo. O design é de rara beleza e
sua precisão nas previsões astronômicas é impressionante. Considerando o
cuidado de sua construção e a unicidade de seu funcionamento, tenho que
considerar este mecanismo, do ponto vista histórico, como sendo mais valioso
que a pintura Mona Lisa”.
Compõe atualmente do acervo do Museu Arqueológico
Nacional de Atenas, acompanhado de uma réplica elaborada por Derek de Solla
Price, sendo que diversas outras réplicas estão em exposição em vários museus
em todo o mundo, tais como Museu do Computador Americano em Bozeman, Montana,
Museu das Crianças de Manhattan, em Nova York, em Kassel, Alemanha, e no Musée
des Arts et Métiers, em Paris.
O mecanismo encontrado mede aproximadamente
340 × 180 × 90 mm (o tamanho aproximado de um laptop) e compreende 27
engrenagens de bronze, feitas a mão, organizadas primitivamente em uma caixa ou
moldura de madeira, constituindo-se no mais antigo computador analógico
conhecido, concebido para representar mecanicamente a órbita da Lua, de outros
planetas do Sistema Solar e do próprio Sol além de indicar, como afirmado
anteriormente, os ciclos de 4 anos dos jogos olímpicos e de outros eventos tais
como eclipses solares.
O artefato é também notável por empregar a
engrenagem diferencial, que se acreditava ter sido inventada apenas no século
XVI, e pelo nível de miniaturização e complexidade de suas partes, comparável
às dos relógios produzidos a partir do século XVIII.
Estima-se que em sua construção tenham sido
utilizadas muito mais engrenagens que as encontradas, supondo-se que muitas se
perderam, provavelmente durante os 2000 anos em que o dispositivo ficara
submerso até seu resgate em 1901.
Todas as inscrições encontradas no mecanismo
foram feitas em grego koiné, sugerindo que o mecanismo tenha sido construído no
mundo helênico em 97 a.C provavelmente em uma academia fundada pelo filósofo
estoico Posidônio na ilha grega de Rhodes, que na época era conhecida como um
centro de astronomia e engenharia mecânica; esta hipótese sugere ainda que o
mecanismo possa ter sido projetado pelo astrônomo Hiparco, uma vez que contém
em sua dinâmica de funcionamento vários elementos de sua célebre Teoria Lunar.
Recentes descobertas sugerem ainda que o
conceito para sua construção tenha origem mais provável nas colônias de
Corinto, o que pode implicar uma conexão com o grande Arquimedes de Siracusa.
A polêmica sobre sua funcionalidade e
precisão, ganhou força pela divulgação de várias teorias que aventam a
existência de civilizações mais avançadas que contribuíram para o avanço da
humanidade em tempos imemoriais compondo uma tecedura intricada de descobertas
arqueológicas no mínimo inquietantes. Descobertas essas agrupadas em torno do
conceito de OOPART (Out of Place Artifact).
Aliás, esse é um dos meus temas preferidos,
inclusive abordado em alguns de meus contos, tais como os premiados
“Propriedade Intelectual” e “Singularis Verita” (A Cor da Tempestade, Multifoco – Rio de Janeiro – 2011) e
no meu romance “O Mesmo Sol que Rompe os Céus” (ainda no prelo), reportando-se
a essas tão estranhas teorias que tendem a nos apresentar “verdades muito
singulares”.
Polêmicas à parte, esse artefato pode ser
prova de que a história, como nos foi ensinada na escola é, no mínimo,
incompleta ou subestima a nossa capacidade de evolução e de criação; podendo
atuar também como um convite à superação de nossos preconceitos.
Nesse nosso calendário Olímpico, a meu ver,
não há nada mais competitivo do que isso:
- Superarmos nós mesmos, todos os dias, ante
o girar das engrenagens insólitas de um computador de dois mil anos.
-o-
Em tempo: O termo “OOPART” foi criado pelo
biólogo e escritor escocês naturalizado americano, Ivan Sanderson Terence e é
pouco aceito pela ciência oficial. É empregado para designar objetos relevantes
para a história, arqueologia e paleontologia e que foram descobertos fora de
contexto ou em sítios incomuns.
O termo também inclui artefatos aparentemente
“impossíveis” de serem encontrados naquele local, por serem anacrônicos ou por
possuírem uma tecnologia contrastante com os demais artefatos encontrados. Mas
– bem – isso já é assunto para outro artigo – não perca!
-o-
Assista o vídeo da BBC World Service sobre o
Mecanismo de Anticítera:
[Imagens:Wikipedia]
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