“Lá nas alturas, numa estranha e remota constelação existe uma pequena estrela que os astrônomos descobrirão um dia. Pelo menos, não tenho notícias de que nenhum homem de ciência a tenha descoberto, ainda, não obstante ser sua superfície habitada. É uma estrela em cujo solo crescem plantas e animais estranhos, e nenhum destes mais estranho que o homem de ciência...”.
http://www.permanencia.org.br/revista/Pensamento/chesterton1.htm
Desta maneira começaria eu uma história do mundo se quisesse seguir o costume científico de abrir o texto com uma série de considerações de ordem astronômica. Intentaria ver o planeta Terra, de fora, não pela sua posição vulgaríssima com relação ao sol, mas, sim, mediante um determinado esforço imaginativo, tendente a criar a noção de que possa pertencer ao nosso planeta um ser que não viva na sua superfície.
Mas, de outra parte, não creio que a desumanização seja um bom processo para se estudar a Humanidade. Não creio seja de mister insistir nas distâncias astronômicas para demonstrar que o mundo é muito pequeno. E, como não é fatível a idéia de fazer da terra um planeta que nos seja desconhecido para lhe dar uma nova significação, tão pouco recorrerei ao artifício de apequena-lo para torna-lo insignificante. Quase que me atrevo a sugestão de que, nem sequer sabemos que a terra seja um planeta, no sentido em que conhecemos ser o lugar onde vivemos. E um bem esquisito lugar, por certo. É este o ponto que desejo marcar de início: não de uma maneira astronômica, mas, sim, de um modo simples e familiar.
Uma das minhas primeiras aventuras na vida jornalística refere-se a Grant Allen quando este escreveu um livro sobre “A evolução da idéia de Deus”. Ocorreu-me, então, relevar que teria sido muito mais interessante um livro de Deus sobre a evolução da idéia de Grant Allen. Recordo-me de que o diretor de redação me disse que aquilo era uma blasfêmia. Pois, traduzindo em linguagem corrente, significativa: “Vou mostrar como a insensata idéia de Deus foi se desenvolvendo entre os homens”. Minha observação era perfeitamente piedosa. Nela eu reconhecia os desígnios divinos, mesmo nas suas manifestações mais obscuras e insignificantes.
Esse incidente serviu-me para aprender muitas coisas, entre estas, que a fonética tem papel proeminente na apreciação do piedoso e da blasfêmia. Meu diretor não se apercebera do ateísmo do título do livro de Allen, porque na palavra mais extensa estava o princípio e em uma das mais curtas o fim. Ao contrário, em minha observação, uma das palavras mais curtas começava a frase, e isso foi o que o impressionou desagradavelmente. Tenho observado que se se puser, por exemplo, a palavra Deus perto da palavra cão – e segue o exemplo – tem-se a impressão de se ter ouvido um disparate, sente-se a reação de quem acabasse de ouvir uma forte descarga.
E não se diga que Deus fez o cão que isso não vem ao caso. Só se pode considerar como estéreis discussões de teólogos. Mas, ao contrário, se começarmos a frase com uma palavra de muitas sílabas como “evolução”, então, a impressão já é outra e o resto da frase pode passar livremente, sem maior exame. Foi o que aconteceu, possivelmente, com o meu diretor – não lera todo o título do livro, porque era extenso e ele um homem de muitas ocupações.
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