Nesta
quarta-feira, 4 de julho de 2012, os cientistas do CERN, laboratório europeu de
partículas de alta-energia, anunciaram que nos dados coletados em dois anos de
colisões de prótons estão os rastros de uma estranha partícula, uma
partícula que eles tem 99% de certeza de que é uma nova partícula, algo nunca
visto antes em laboratório.
O bóson de Higgs é um dos componentes do chamado
Modelo Padrão da Física. O que nos leva a outras perguntas…
Retrato
de Família
A nossa história começa com a descoberta do
elétron, em 1876, por J. J. Thompson. Em 1911 um outro inglês, Ernest
Rutherford, propôs o primeiro modelo para o átomo, que seria composto por um
núcleo e uma eletrosfera. Rutherford também foi o descobridor do próton, que ele
achou que era uma partícula fundamental (ou seja, não composta de outras
partículas).
A descoberta de outras partículas nos anos que se
seguiram levaram à criação de um modelo que usava partículas fundamentais, os
léptons e quarks, para formar outras partículas. O próton, por exemplo, foi
modelado como sendo composto por dois quarks e um anti-quark.
Além dos léptons e quarks, seis de cada,
conjuntamente chamados de férmions e que estão envolvidos na formação de
partículas, foram propostos quatro bósons, que estariam envolvidos nas
interações das forças – a força eletromagnética, que seria intermediada pelos
fótons, e as forças nuclear forte, intermediada pelos glúons, e nuclear fraca,
intermediada pelos bósons W e Z.
Para completar a família, haveria ainda uma
partícula para intermediar a gravidade, o Gráviton (ainda não detectado), e o
bóson de Higgs, que não participaria da constituição de nada, mas que seria
responsável pela massa das outras partículas.
Bóson ou
Campo? Os dois
Cabe aqui uma observação. O bóson de Higgs é o
quantum de um campo, chamado campo de Higgs. Em outras palavras, o menor valor
de um campo de Higgs é um bóson de Higgs, ou ainda, o campo de Higgs é feito de
bósons de Higgs. E onde está este campo? Em todo o universo. Estamos todos mergulhados
neste campo, que está em todos os lugares, sem faltar em lugar nenhum.
A interação das partículas com o campo de Higgs é
que daria a massa a estas partículas, e não só a elas, mas também aos
intermediadores das forças (menos a força eletromagnética, intermediada pelo
fóton, que tem massa zero, ou seja, não interage com o campo de Higgs). Sem o
campo de Higgs, não haveria massa, não haveriam átomos, não haveriam moléculas,
não haveriam planetas, não haveriam estrelas, não haveriam reações químicas,
não haveria vida, não haveria eu, nem haveria você.
Voltando ao Modelo Padrão, as partículas
fundamentais, todas elas, foram sendo encontradas, uma a uma, nos laboratórios.
Só o bóson de Higgs que não. E isto era um problema. Sem encontrar o bóson de
Higgs, ninguém sabia exatamente quais as propriedades dele. Algumas
propriedades podiam ser previstas, mas outras, não. Ironicamente, a massa do
bóson de Higgs era uma das propriedades que não podia ser prevista.
Caçada ao
bóson, ou fogos de artifício para Higgs
Os modelos também prediziam uma outra coisa, para
que o bóson pudesse ser detectado, seria necessário acertá-lo com uma cacetada
de energia. Mais precisamente, com uma martelada maior que 1,4 TeV (tera
elétron-volts), ou 10¹² elétron-volts. Parece bastante energia, mas só no mundo
microscópico. Você vai precisar 100.000.000 TeV para acender uma lâmpada de
100W por um segundo. Ou, dito de outra forma, um mosquito voando tem 1 TeV. Só
que um mosquito tem muitos, mas muitos prótons. Se você der esta energia toda
para um só próton, e fizer ele bater de frente com outro próton que tenha
também 1 TeV, o impacto vai destruir os dois prótons em uma chuva de partículas
menores.
Entra em cena o LHC (Grande Colisor de Hádrons).
Ele foi feito para colidir prótons com 7 TeV, ou seja, 5 vezes o valor mínimo
teórico. Só que ele estava operando em 4 TeV, que não é sua capacidade plena,
mas ainda é o suficiente para criar colisões interessantes. Dois anos colidindo
partículas, e hoje temos o anúncio feito por duas das equipes do LHC de que
eles tem 99,9% de certeza que descobriram uma nova partícula que tem todo o
jeito de ser o bóson de Higgs.
Rescaldo,
perspectivas
E agora, o que vai acontecer? Para que será usado o
bóson de Higgs? Muita coisa, começando pela física teórica. A descoberta desta
partícula a deixa à disposição dos cientistas para análise de suas
propriedades. Já sabemos, por exemplo, que o bóson de Higgs tem massa de
aproximadamente 133 prótons, ou 125 GeV/c² (sim, a massa está sendo expressa em
termos de energia dividida pela velocidade da luz ao quadrado, m = E/c²), e
este é só o começo.
O que mais dá para fazer com o bóson de Higgs, além
de entender a natureza e o universo em um nível realmente profundo? Nada mais.
Talvez da tecnologia usada para encontrar o bóson saia alguma coisa para o
cidadão comum, mas o objetivo nunca foi este: sempre foi responder a perguntas
essencias, como “do que é feito o universo”. O conhecimento é, sem sombra de
dúvida, a maior aventura humana, e a descoberta do bóson de Higgs é parte desta
aventura.[Wired, Reuters, CERN, Terra Notícias, Ceticismo.net, Superinteressante]
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